Caminhando por Mogi:

A Resistência dos Povos Indígenas e Negros”

Parceria com o SESC – Mogi das Cruzes.

Olá, sejam bem-vindos a Mogi das Cruzes!

Nossa jornada de hoje nos levará por um passeio pelo centro histórico da cidade, desvendando as marcas da presença dos povos originarios e dos negros na construção da identidade mogiana.

Antes de iniciarmos nosso passeio, é fundamental reconhecer que, muito antes da chegada dos colonizadores, esta terra já pulsava com a força e a sabedoria dos povos indígenas, os verdadeiros donos desta terra. A história de Mogi se entrelaça com a história de luta e resistência dos povos originários, e carregamos essa herança em nosso solo.

Os índios e a formação de Mogi das Cruzes

A história de Mogi das Cruzes está intrinsecamente ligada aos povos indígenas, especialmente os Guaianazes, que habitavam a região muito antes da chegada dos colonizadores europeus. A participação desses povos originários foi fundamental para o estabelecimento e o desenvolvimento inicial da cidade.

Presença ancestral:

Antes da fundação oficial de Mogi das Cruzes em 1611, os Guaianazes já ocupavam a região do Alto Tietê. Seus conhecimentos sobre o território, a flora e a fauna locais foram essenciais para a sobrevivência dos primeiros colonizadores.

Fundação da cidade:

A interação inicial entre os Guaianazes e os portugueses foi relativamente pacífica, o que facilitou o estabelecimento do povoado que viria a se tornar Mogi das Cruzes. Os indígenas auxiliaram os recém-chegados a se adaptar ao novo ambiente, compartilhando técnicas de cultivo e conhecimentos sobre plantas medicinais.

Contribuições culturais:

A influência indígena pode ser percebida em diversos aspectos da cultura mogiana. Nomes de lugares, técnicas de agricultura, hábitos alimentares e o uso de plantas medicinais são exemplos claros dessa herança.

Mão de obra e conhecimento local:

Os índios foram fundamentais como mão de obra nos primeiros anos da colonização, participando da construção das primeiras edificações e do cultivo das terras. Seu conhecimento sobre as rotas fluviais e terrestres também foi crucial para a expansão do povoado.

Desafios e conflitos:

Com a chegada dos portugueses no século XVI, os Guaianases sofreram com a invasão de seus territórios, a escravidão e as doenças trazidas pelos europeus.

  • Resistência: Inicialmente, os Guaianases resistiram à presença portuguesa, mas foram, aos poucos, sendo dominados pela superioridade bélica dos colonizadores.
  • Escravização: Muitos Guaianases foram escravizados e obrigados a trabalhar nas plantações de cana-de-açúcar e outras atividades.
  • Catequização: Os jesuítas também atuaram na catequização dos Guaianases, buscando convertê-los ao cristianismo.
  • Miscigenação: A longo prazo, a interação entre portugueses e Guaianases levou a um processo de miscigenação, com a formação de uma população mestiça.

Legado linguístico:

Muitos topônimos da região têm origem indígena, como o próprio nome “Mogi”, que significa “rio das cobras” na língua tupi. Isso demonstra a profunda influência indígena na formação da identidade local e ai temos Taiaçupeba, Jundiapeba, Biritiba Ussu, Itapety, Botujuru, Rua Ipiranga entre outros.

Miscigenação e formação da população:

A mistura entre indígenas, portugueses e, posteriormente, africanos, contribuiu para a formação da população mogiana, criando uma rica diversidade cultural.

O Negro em Mogi das Cruzes

A escravidão no Brasil tem suas raízes no início do período colonial, quando os portugueses, após chegarem em 1500, começaram a explorar as terras recém-descobertas. Inicialmente, tentaram escravizar os povos indígenas, mas devido à resistência nativa, às doenças trazidas pelos europeus e à proteção de alguns setores da Igreja Católica, essa prática não se sustentou em larga escala.

Com o desenvolvimento da economia açucareira no Nordeste no século XVI, a demanda por mão de obra aumentou significativamente. Os portugueses, já familiarizados com o tráfico de escravos na África, voltaram-se para este continente como fonte de trabalho forçado. Assim, a partir de meados do século XVI, iniciou-se o tráfico transatlântico de africanos escravizados para o Brasil.

Os africanos eram capturados em diversas regiões da África, principalmente na costa ocidental, e forçados a atravessar o Atlântico em condições desumanas. Ao chegar ao Brasil, eram vendidos como mercadorias e distribuídos por diferentes regiões do país, de acordo com as necessidades econômicas de cada área.

À medida que a colonização avançava para o interior, os escravizados eram levados para novas fronteiras econômicas. No caso de São Paulo, a presença de africanos e seus descendentes se intensificou com o desenvolvimento da agricultura e, posteriormente, com o ciclo do ouro no século XVIII.

Foi neste contexto de expansão e desenvolvimento econômico que os africanos escravizados chegaram a Mogi das Cruzes. Fundada em 1611, a cidade de Mogi das Cruzes, localizada no que hoje é conhecido como Alto Tietê, tornou-se um importante ponto de passagem e estabelecimento na rota entre o litoral e o interior paulista.

A participação do negro na construção da cidade de Mogi das Cruzes é um capítulo fundamental na história local. A presença e a contribuição dos africanos e seus descendentes em Mogi das Cruzes são elementos essenciais na formação da identidade e cultura local. Assim como os indígenas e os portugueses, os africanos desempenharam um papel crucial na construção da cidade, tanto no aspecto econômico quanto cultural.

As marcas do negro na cidade

Conforme caminhamos pelas ruas de paralelepípedos, observem as construções ao redor. Imaginem o suor, a força e a habilidade das mãos negras que ergueram cada tijolo destas casas, igrejas e monumentos. A mão de obra escravizada africana foi fundamental para o desenvolvimento econômico de Mogi, impulsionando, em especial, os ciclos do café e da cana-de-açúcar.

Adentrando o centro histórico, podemos observar casarões coloniais que testemunharam o trabalho doméstico realizado por homens e mulheres negras. Imaginem as histórias que essas paredes guardam: alegrias, tristezas, cantos de trabalho e de esperança sussurrados em idiomas trazidos de terras distantes.

Pontos à observar:

  1. Calçadas Estreitas e Posição Social:
  • Observação: Os escravos eram forçados a trabalhar na construção da cidade. Eles construíam calçadas estreitas porque era isso que os donos e as autoridades queriam.
  • Depois, quando andavam pela cidade, eles tinham que usar essas mesmas calçadas estreitas que eles próprios ajudaram a construir. As calçadas estreitas tornavam difícil para os escravos se moverem livremente ou se reunirem em grupos nas ruas.
  • É como se os escravos fossem obrigados a criar obstáculos para si mesmos, sem ter escolha no assunto. Isso mostra como a escravidão afetava todos os aspectos da vida dos escravizados, até mesmo a forma como eles podiam se movimentar nas cidades que ajudaram a construir.
  1. Materiais de Construção:
  • Exame Detalhado:
  • Ao observarmos construções históricas, nossa atenção é frequentemente atraída pela imponência de pedras e tijolos, testemunhas silenciosas do passado. Essas estruturas não apenas contam histórias de grandeza e poder, mas também lembram a complexidade dos processos de construção ao longo dos séculos. No entanto, é crucial lembrar que a produção desses materiais e a própria construção dependiam do trabalho árduo e forçado de africanos escravizados.
  • Discussão Histórica:
  • Essa realidade se conecta diretamente ao documento em questão, que destaca o papel crucial dos escravos na economia colonial. É preciso confrontar a disparidade gritante entre o trabalho pesado realizado pelos escravizados, que contribuíram significativamente para a riqueza e o desenvolvimento das cidades, e as condições precárias e desumanas em que eram forçados a viver. Essa análise nos obriga a refletir sobre as injustiças do passado e suas repercussões no presente.

Igrejas e a Fé como Consolo

Reflexão:

Ao passarmos por igrejas, é inevitável reconhecer a complexa relação entre a religião católica e os africanos escravizados. Inicialmente, o catolicismo foi imposto como uma ferramenta de dominação cultural e espiritual, servindo aos interesses coloniais de uniformidade religiosa e controle social. No entanto, com o tempo, essas mesmas igrejas se transformaram em espaços de refúgio e preservação cultural. Para muitos africanos escravizados, a fé católica, embora imposta, tornou-se uma fonte de consolo espiritual e uma maneira de manter vivas suas tradições e identidades culturais, muitas vezes de forma sincrética.

Resistência Cultural:

Dentro desse contexto, surgiram as irmandades religiosas negras, que desempenharam um papel crucial na resistência cultural e no apoio mútuo entre os escravizados. Essas irmandades funcionavam como comunidades de suporte, oferecendo não apenas assistência espiritual, mas também social e econômica. Incorporando elementos africanos em suas práticas religiosas e festividades, essas organizações desafiavam silenciosamente a hegemonia cultural imposta. Assim, as igrejas, paradoxalmente, tornaram-se locais onde a resistência cultural e a adaptação se entrelaçaram, permitindo que a rica herança africana sobrevivesse e florescesse sob a superfície do domínio colonial.

Artigo de Paulo Pinhal

Almas Resilientes: O Legado Vivo de Indígenas e Negros em Mogi das Cruzes

Mogi das Cruzes, uma cidade rica em história e cultura, carrega em suas raízes a profunda influência dos povos indígenas e negros. Apesar das tentativas históricas de apagamento e subjugação, o legado desses povos permanece vivo e palpável, ressoando através dos tempos.

Os indígenas, habitantes originais da região, enfrentaram a colonização com bravura e resistência. Embora muitos tenham sido exterminados ou deslocados, sua presença ainda pode ser sentida na alma da cidade. Os nomes de rios, bairros e ruas são testemunhas silenciosas de sua existência. Mais do que isso, a relação íntima com a natureza, o respeito pelos ciclos naturais e o uso sustentável dos recursos são práticas herdadas dessas comunidades, que continuam a influenciar a cultura local.

Por outro lado, os negros, trazidos à força da África, desempenharam um papel crucial no desenvolvimento de Mogi das Cruzes. Mesmo sendo sistematicamente apagados da narrativa oficial, sua contribuição é inegável. Os conhecimentos ancestrais africanos se manifestam na arquitetura, no traçado das ruas e nas técnicas de construção das casas, que muitas vezes incorporam elementos de resistência e adaptação ao clima local. As festas, a música e a culinária também carregam essa herança, sendo fontes de identidade e orgulho para muitos mogianos.

A presença negra é visível nas tradições culturais e religiosas que permeiam a cidade. Festas como a Congada, Moçambique e Marujadas, são celebrações vivas da resistência e da cultura afro-brasileira, mantendo viva a chama da ancestralidade. Além disso, o sincretismo religioso, que mescla elementos africanos com o catolicismo, é um testemunho da resiliência e da capacidade de adaptação desses povos.

Em Mogi das Cruzes, a história dos povos indígenas e negros é uma narrativa de resistência e resiliência. Apesar das tentativas de apagamento, suas almas continuam a habitar a cidade, influenciando a cultura, as tradições e a identidade local. O reconhecimento e a valorização desse legado são essenciais para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva, que honra suas verdadeiras raízes e aprende com elas. Assim, Mogi das Cruzes não apenas preserva sua história, mas também celebra a diversidade e a riqueza cultural que esses povos trouxeram e continuam a trazer para a cidade.

5 comentários em “Caminhando por Mogi:”

  1. Deveria fazer uma exposição com mais imagens, já que praticamente derrubaram a cidade e asfaltaram quase tudo, a gente sai daqui de Mogi das Cruzes para as cidades e históricas de Minas Gerais e esquecemos da nossa querida cidade

  2. As marcas da conquista e ocupação do território “Guayaná” que a rigor, em parte subjugados, se definiram e se aliaram aos europeus para se protegerem dos contrarios contrários, os “Tamoyo”, que tinham Bertioga como divisa territorial. Ainda existe cópia dessa carta de “doação”originada em 1580, assinada pela coroa portuguesa. Esse suposto se originava a Leste, na Serra da Cantareira, em Sta Izabel e segue ao Sul até quase Ribeirão Pires, numa extensão de 6 léguas. E ainda está demarcado alinhamento no urbanismo da cidade, que cruza o centro, através da Rua Dr.Paulo Frontin, quase paralelo, onde existiu a igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, ambiguanente demolida durante a década de 60. História apagada, somente atestada por vestígios e simulacros…!!! Parabéns Paulo Pinhal e equipe do Sesc por está iniciativa.

  3. Parabéns, pelo seu trabalho, pesquisa e por valorizar o trabalho de tantos homens e mulheres que foram esquecidos ao longo dos anos, estas histórias devem ser amplamente divulgados para as escolas e população em geral.
    Devemos valorizar os povos que deixaram um forte legado na cultura Mogiana.
    Nossas ruas, becos, igrejas tem muitas histórias é uma pena que muitas casas e casarões foram demolidos.
    Paulo Pinhal grata por tantas informações.
    Você é um excelente arquiteto, professor, pesquisador, escritor….

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